Mãe, como cuidar da sua saúde mental?
Mente e emoções são partes integrantes da nossa saúde tão essenciais à vida e tão impactantes em nossa realidade quanto o nosso corpo. Falar em saúde mental não pode ser algo cercado de medos e preconceitos, pois essa deve ser uma das nossas prioridades todos os dias. Trazendo para a maternidade então, não precisamos e nem podemos cuidar dos outros sem cuidar de nós mesmas. E esse entendimento é um passo decisivo na busca do equilíbrio emocional tão importante nessa fase da mulher.
Os ciclos que envolvem a maternidade são acompanhados de experiências intensas e de grandes transformações sendo comum que a mulher fique mais sensível e vulnerável e assim precise de uma rede de apoio. O que ocorre é que muitas vezes as mães não sabem e não falam sobre essas dificuldades e têm medo de admitirem que precisam de apoio ao nível psicológico, mental, emocional, por receio de serem julgadas, consideradas incapazes de cuidar de seus filhos e de lidar com a maternidade. Muitas sofrem caladas.
É necessário mudar isso. E a informação é grande aliada nesse processo. Por isso, conversamos com a psicóloga e arteterapeuta especializada em perinatalidade e parentalidade, Erika Novaes, e trouxemos alguns pontos que merecem uma reflexão e podem ajudar as mamães a deixarem o medo de lado e manterem-se mentalmente sadias.
MQA: O QUE AS MÃES PRECISAM SABER SOBRE SAÚDE MENTAL E OS PRINCIPAIS CUIDADOS PARA O EQUILÍBRIO EMOCIONAL?
ERIKA NOVAES: O ciclo gravídico puerperal (gestação, parto e puerpério – [período de 6 a 8 semanas pós-parto durante o qual o corpo retorna ao estado pré-gravidez]), é uma fase delicada da vida da mulher à medida que física e psiquicamente, o processo de gestar, parir e cuidar de um bebê pode tratar-se de experiência intensa e de grandes transformações. Não é incomum que a mulher se sinta mais sensível e fique mais vulnerável. Seu corpo está mudando, os papéis sociais mudam, e a vida toda pode ser que seja resignificada. Por conta deste estado de vulnerabilidade, inconstância e desconhecimento, é que pode ser importante, e bastante benéfico que a gestante possa participar de grupos de gestantes, grupos terapêuticos, pré-natal psicológico, ou psicoterapia individual, no sentido de se permitir um encontro consigo mesma e com todas as mudanças psíquicas pelas quais está passando e ainda irá passar no puerpério.
Em algumas situações, mais que outras, é necessário que se preste mais atenção à possíveis sintomas, como por exemplo, se a gestante tem um histórico de depressão, transtorno de ansiedade, ou qualquer transtorno psiquiátrico. Nestes casos, a importância de um acompanhamento psicológico pode ser ainda mais importante.
É necessário que as mulheres saibam e falem sobre a solidão do puerpério e da maternidade, para que possam antecipar-se e tentar, na medida de suas possibilidades, criar uma rede de apoio em seu entorno. Ter com quem contar também pode ajudar a manter-se mentalmente sadia.
MQA: A PSICOLOGIA FALA EM NASCIMENTO PSÍQUICO DA MÃE, QUE PODE ACONTECER EM MOMENTOS DIFERENTES. O QUE É E COMO ENTENDER ESSE NASCIMENTO?
ERIKA NOVAES: O nascimento psíquico de uma mãe acontece no momento em que ela deseja a maternidade e, mais que isso, no momento em que ela deseja aquele filho que espera e gera em seu ventre. Pode ocorrer de uma mulher gestar, parir e uma mãe nascer apenas depois do convívio com o filho. Isso não a torna, necessariamente, menos apta. Ela pode tornar-se mãe a partir da ideia de engravidar, durante a gestação, no nascimento, ou pode ser que, naquela gestação específica esse nascimento simplesmente não aconteça. É importante que isso seja dito, a partir do pensamento de que vivemos em uma sociedade que ainda acredita que exista um instinto materno capaz de nos fazer amar a priori e incondicionalmente nossos filhos, sem levar em conta a subjetividade de cada mulher, suas realidades e o próprio contingente cultural no qual estamos inseridos.
MQA: A QUE SE REFERE O TERMO “BABY BLUES” E QUAL A SUA RELAÇÃO COM A DEPRESSÃO PÓS-PARTO?
ERIKA NOVAES: Baby blues e depressão pós-parto são coisas completamente diferentes, apesar de parecerem iguais em muitos aspectos. Baby blues ou tristeza materna é um estado de melancolia no qual a grande maioria das mulheres se encontra durante parte do puerpério. Não é doença, é funcional e faz parte do processo de se haver com todas as transformações decorrentes da maternidade, e com os lutos que se faz ao parir um bebê (pela perda da barriga, pela perda do filho que se imaginava e que nunca vem igual ao que se idealizava, pela perda do papel de filha, dentre outros). Isso sem levar em conta, também, as questões hormonais.
Depressão pós-parto, por sua vez, se trata de uma depressão desencadeada por algum processo ligado ao gestar e parir/cuidar e que se dá no puerpério. É um quadro que necessita atenção, que pode requerer tratamento psiquiátrico e acompanhamento psicológico.
MQA: E O QUE DIZER SOBRE A AFIRMAÇÃO DE QUE “MÃE PRECISA DE COLO”?
ERIKA NOVAES: Qualquer afirmação quando se fala em maternidade, não me soa muito bem. No entanto, parece ser quase um fato consumado que mãe precisa sim de colo. Se pensarmos na maternidade como uma experiência de ruptura, do papel de filha, do corpo de antes da gestação, do filho ideal e do ideal de mãe que se tinha antes de tornar-se mãe… Ou seja, se pensarmos na maternidade como uma vivência na qual nada fica no lugar de antes, e que, por isso a mulher se encontra em um estado de vulnerabilidade psíquica, dar apoio a ela, ofertando não apenas colo, mas ouvidos empáticos e, efetivamente, ajuda prática, as chances de ela desenvolver qualquer transtorno psíquico cai, ela se sentirá, provavelmente, mais feliz e mais confiante, e uma mãe feliz e confiante, tende a desempenhar a função materna de maneira mais interessante. E quem ajuda, pode sentir-se envolto a uma experiência muito transformadora. Todos saem ganhando.
Sobre a entrevistada:
Erika S. de Novaes (CRP. 06/102892) – nucleoanima@gmail.com
Psicóloga e arteterapeuta formada pela Universidade Paulista (UNIP), é especializada em perinatalidade e parentalidade pelo Instituto Gerar de Psicologia Perinatal e Parental. Atua na área clínica com atendimento a gestantes, casais e puérperas, e coordenando grupos terapêuticos e oficinas criativas. Educadora perinatal pelo Gama (Grupo de Apoio a Maternidade Ativa), ministra aulas em cursos de formação e oficinas, e coordena grupos terapêuticos para profissionais do parto e doulas, além da atuação com doulagem de parto propriamente dita.